::sarau::

Em 2010 eu era um fudido, deslumbrado com o salário de funcionário público. Antes disso eu nunca tinha conseguido ganhar nem mil reais com nada, então minha vida era república, morar de favor ou, o que estava acontecendo naquele momento, morar com meu pai. Daí, quando disseram “você vai trabalhar no bairro Urucuia, no pé da Serra do Rola Moça, onde ninguém quer ir, porque é longe” eu achei lindo, pensei na grana que eu nunca tive e ia ter e fui.
Para trabalhar com cultura.
O centro cultural em que eu trabalhava tinha um sarau mensal, onde a gente reunia pessoas do bairro, elas levavam instrumentos musicais, nós espalhávamos livros e íamos ficando nessa, de ler e ouvir música, contar histórias e eu me senti muito feliz com meu trabalho.
Talvez mais que o emprego em si, mais que o salário (quem vive no corre sabe o valor que o dinheiro tem, então não vou me fazer de sonso sobre a dignidade que a gente adquire com um salário que paga as contas & a cerveja), o sarau me deu as coisas mais bonitas que eu tenho comigo. Ele me deu minha voz e minhas histórias; amigos e esses amigos (que são amores) em algum momento me apresentaram pra Ráisa, que é esposa e é amor (e que não gosta de sarau, mas cada um, cada um).
Mas teve um dia onde rolou uma reunião no centro da cidade, no centro de cultura Belo Horizonte (que depois virou centro de referência da Moda e depois museu da Moda) e nessa reunião eu conheci uma moça que me falou do Coletivoz e disse “Você é do Barreiro? Aparece no bar do Bozó, a gente faz sarau lá”.
Não imediatamente (aliás, levou um tempo bom, mais de ano), acabei indo ao bar do Bozó, ver o sarau do Coletivoz.
Cheguei. O bar do Bozó ficava do lado de uma igreja, porque, no Barreiro, tudo que não é igreja nem salão de cabeleireiro fica do lado de uma igreja ou de um salão. Tinha pouca gente e o boteco tinha um palquinho perto da porta. No fundo, umas mesas com os livros e zines do pessoal, que eles levavam pra vender. Sentei no balcão, pedi uma cerveja e houve poucas vezes na minha vida toda em que eu consegui me sentir tão à vontade, tão acolhido, tão pertencente, do que esse dia. Eu tinha levado uns livros e o Rogério logo sacou que eu tinha ido pra falar poesia. Escreveu meu nome num papelzinho e colocou num boné.
“à luta, à voz!”. Era um grito de guerra, um manifesto curto, de quatro palavras. O palco era um espaço de catarse. Foi a primeira vez que eu ouvi um monte de versos que eu ia continuar ouvindo (e alguns, repetindo) por muito tempo. Devagar, escola; o centro tem seu momento, mas eu prefiro a borda; quer ser o Snoopy Dogg Dogg, mas não consegue ir na esquina comprar hot dog e mais um monte de coisas. Não sei exatamente o que eu li, quando me chamaram no palco. Era Pessoa ou Drummond. Casou direitinho, porque cabe tudo e mais gente tinha subido e lido, também. Lembro que eu me apresentei como Rodrigo da biblioteca, coisa que eu nunca deixei de ser. Vocês nunca vão saber como é bom ser o Rodrigo da biblioteca, mesmo quando a gente não está na biblioteca.
Foi lindo. Acho que fiquei até uma da manhã, bêbado.
Descobri que não tinha ônibus ali naquele horário e não existia Uber naquela época (apesar desse caso ter menos de 10 anos). Atravessei um pedaço do Barreiro à pé, de madrugada, pensando em toda a violência que todo mundo sempre fala que existe. A poesia é a cidade bêbada de madrugada. Lá ia eu, transformado, olhando pra uma cidade que pouca gente vê, por medo.
Tem quase dez anos.
Agora eu vou tentar escrever, pesquisar, refletir, sistematizar saraus no mestrado (vai saber se vai dar certo, mas até aqui é isso). Daí que eu queria lembrar desse sarau, dessa madrugada, pra ter certeza de como tudo de terrível que a academia vai provavelmente fazer comigo é muito importante.
Toda vez que eu volto a um sarau, é nesse que eu volto.

::Café Viena – versão mundo cruel::

Há algum tempo conheci Dora Delano, éramos ambos leitores de um blog sobre relacionamentos desastrados. Ela própria possui um blog, o “Desventuras Amorosas” (listado no seleto grupo à nossa direita), onde fala de… bem… desventuras amorosas. E da Capes.
Sempre tive um cuidado meio devocional com essa moça. Era simpática, inteligente e, o mais importante de tudo, um dos meus três leitores. Não fosse uma relação virtual, levaria café quente e biscoitos à ela sempre que quisesse vê-la lendo e tecendo comentários sobre o que escrevo.
Graças ao Nerito, a condição dessa interação virtual deu um passo interessante. Meu amigo, ainda mais atencioso e cuidadoso com seus leitores que eu (diga-se de passagem, não sei como ele faz isso, já que tem muito mais leitores que eu. Muito mais!), aproximou-se de Dora Delano rasgando um primeiro véu virtual. Ela apresentou-se à nós pra além dos pseudônimos e de repente eu convivia, através da linha do tempo do Facebook, com uma mulher muito diversa da que eu desenhava no blog.
Enquanto Dora Delano é uma moça insegura (à respeito de si, de seus textos, dos amores e do que esperar da vida), Vivian Matos se mostrou (ainda virtualmente) uma mulher decidida, alegre, vibrante e engajada. Dora Delano tem uma foto que mostra uma mulher bonita e oblíqua, que não mostra os olhos e esconde o sorriso com a mão. Vivian Matos escancara um sorriso moreno e luminoso. Coisa sincera. As opiniões políticas muito semelhantes às minhas faziam com que eu procurasse ler os artigos que ela compartilhava, a curtir as fotos de passeios e festas e continuar, da minha mineira distância, nessa postura de reverência. Não era mais só uma leitora. Eu descobri que tinha uma leitora de alto nível. Alguém que não me leria se não acreditasse na minha literatura.
Há pouco tempo consegui (um pouco por acaso e novamente através da intermediação do Nerito e da Simone) connhecer pessoalmente a Vivian. Ela e o namorado, Pedro. Vieram fazer um passeio por BH e conseguimos assentar num bar pra conversar e beber.
Vivian é diferente de Vivian Matos e Dora. Mas conhecê-la pessoalmente iluminou muito as duas personagens pra mim. Ela é pequena e fala baixo. Os olhos mostram uma grande preocupação em absorver o mundo inteiro, são olhos em busca de compreensão. As mãos, quase sempre entrelaçadas às de Pedro, explicam pra ele e pra todo mundo ao redor que sim, o amor existe e nem sempre se constrói no vazio e termina em desaventurança. Vivian e Pedro formam um casal bonito, desses que lembram a letra de “Leo e Bia”.
Ambos de uma calma pouco comum aos cariocas (já tive minhas temporadas pelo Rio. A cada visita, aumenta a paixão pela cidade), estavam muito mais preocupados em nos ouvir, em saber de nossas caóticas ideias e dos movimentos incertos de cada um de nós por essa BH decadente e em ruínas, do que em falar. Os filhotes de lobo estavam felizes e brincalhões. Queríamos ser os melhores anfitriões do mundo.
Foi uma noite das mais interessantes. O álcool sempre atrapalha meu objetivo de observar as coisas com calma e aprender as pessoas. Acabo me tornando expansivo demais, canastrão demais, com histórias demais pra contar.
Mesmo assim, não pude fugir da sensação de calma e de alegria que o casal transmitia. Na hora de ir embora, quase desci com eles até o hotel, só pra esticar a prosa mais um pouquinho. Mas era tarde. Cariocas em Minas dormem cedo (e acreditam no que vem escrito nos cardápios).
Agora Dora fez um texto que é a coisa mais fofa, comentando esse encontro. E desfazendo as impressões que ela construiu sobre nós, a partir de nossos textos. E pintou os filhotes de lobo brincalhões que somos quando nos ajuntamos.
Aproveito esse momento, Dora Delano, pra dizer a você que não fique nem só com minha aparência literária, nem com a do companheiro de boteco. Até porque vários dos meus amigos me definiriam sem medo como um ébrio  ermitão sisudo. E não se sinta uma caçulinha. Você é mais escritora que eu. Ou tão escritora quanto eu, pra evitar a auto flagelação.
Em função dessa vida louca e impossível de gerenciar (quem apostaria, por exemplo, que naquela noite eu me sentaria pra desenhar na Praça da Liberdade? E que isso fez com que eu chegasse ao centro no momento exato de pegar meu ônibus, sem precisar ficar esperando.), por causa mesmo do ritmo acelerado que te trouxe aqui (você veio pra descansar, não é?) é que eu acredito que não é impossível contar com as companhias de Você e Pedro pra um chopp no Amarelinho, aí no Rio. Quando? Sei lá. citando o Milton Nascimento “qualquer dia, amigo, eu volto a te encontrar”.

::Semana do servidor público – dia final::

Não é que eu esteja começando um relato pelo último dia, porque isso ia ser mais moderno, mas arrojado literariamente e o escambau. É que dos três dias de atividades, só pude aparecer nesse mesmo.
A proposta da semana do servidor público era ajuntar dentre os funcionários da Cultura, os que produziam alguma “coisa” cultural e colocá-los pra se apresentar pros outros. Ao contrário do que costuma acontecer em várias iniciativas desse tipo (e iniciativas grandes, como a pomposa “mostra de centros culturais”), o pessoal da literatura foi chamado e -surpresa das surpresas! – foi chamado para ler! Sem a produção de um web documentário, sem o acompanhamento de um grupo de percussão, sem a necessidade de se fantasiar de menestrel da idade média. Era o neguinho mais seu texto contra a platéia. Eu era um desses neguinhos aí.
Claro que não foi só isso, mas eu precisava começar elogiando o respeito que tiveram com quem escreve. E isso, pra mim, é também o respeito que se tem com quem canta, com quem toca e com quem faz performance cênica. Valeu, Carol Craveiro!
Não vou dar detalhes do evento, porque nem saberia conduzir muitos comentários, sempre fui um participante ausente de qualquer lugar que eu frequente (perguntem aos meus amigos). Mas houve muita música, muita fofoca (funcionários públicos reunidos) e a Lagoa do Nado é linda, não importa o quanto a prefeitura tente fingir que ela não está ali.
Mas então, perdi duas virgindades literárias ao mesmo tempo: fiz a primeira leitura pública desses textinhos sem vergonha que escrevo aqui e fiz a primeira apresentação do Coletivo Filhote de Lobo.
Como Nerito estava de férias no dia, fomos só Simone e eu. Se alguém lê os três blogs vai perceber que faltou exatamente a parte mais iluminada do coletivo. Não se enganem, Nerito é um rapaz de alma soturna, mas ele é quem tem os textos que deixam as brechas necessárias para uma felicidade vindoura. Uma alma soturna, mas pura.
Então o coletivo Filhote de Lobo subiu no tablado no meio daquela comemoração bonita e espirituosa e desceu o sarrafo no povo. Tá, mentira, a gente até leu umas coisas que flertavam com erotismo e com a paixão. Mas eu abri com um desabafo magoado e raivoso e Simone leu “Gato, Coração, Parede”, o texto mais triste e incômodo da história da literatura. No meio disso, os poemas dela. A gente desceu, todo mundo parabenizou e eu até passei os endereços dos blogs pra uma pessoa. Quem trabalha com leitura no Brasil, sabe a expressividade do número 1. Outros colegas da literatura se apresentaram e o gosto dos nossos textos foram se dispersando nos ouvintes, menos em nós mesmos, assombrados para sempre por nossas próprias ideias. O pessoal da música reassumiu, chegou cerveja e o mundo continuou do jeito que estava, para um leve desapontamento meu. Publico abaixo meu desabafo, para conhecimento:

“Antes eu tinha a desculpa de ter nascido em 1982. A globalização estava engatinhando, as relações comerciais apenas começavam a se tornar mais importantes que as relações políticas e os sociólogos tinham acabado de perceber que o modelo econômico tinha finalmente sobrepujado o modelo de governo.
Todas as desigualdades sociais, educacionais e culturais já estavam dadas quando nasci. Fazia quase 500 anos desde o início do massacre e esse massacre mudou tanto, que na minha cabeça, em 1982, ele talvez nem existisse mais.
Nasci num tempo em que o governo a e sociedade governada se mobilizavam (ou fingiam se mobilizar) ao redor de questões muito delicadas, das chamadas “dívidas históricas”. Não havia pra mim muito problema em ser um homem branco e heterossexual, porque tudo que eu precisava fazer era mostrar que não era o homem branco heterossexual modelo 1500. Eu não queria massacrar, hostilizar ou excluir ninguém. O movimento agora era outro. Era fazer valer a igualdade e lutar pela implementação política dessa igualdade, sem hipocrisias.
Sem hipocrisia, mas talvez com uma cegueira que beire a imbecilidade.
Porque até então eu creditava os grandes genocídios históricos do Brasil a outros homens, a outros tempos históricos, a motivações que no fim do século XX e início do XXI já não se sustentavam. Genocídio era coisa da gestão passada. De outros homens brancos, os de antigamente. Imbecilidade minha, mais que inocência. Ninguém é inocente.
Mas o que é que acontece? Nos reunimos ao redor de questões triviais, de discussões artísticas e filosóficas menores, egoístas, mas nobres o suficiente para nos dar a sensação de alheamento politizado, de “é assim que eu faço a minha parte”. Enquanto isso o genocídio continua e vamos matar uma tribo de índios inteira.
Ou possuo contemporâneos tão idiotas a ponto de não enxergarem que o suicídio coletivo é um genocídio decidido por nós, nossos governantes e nossas estrelas de televisão?
O massacre continua e se antes eu me consolava pensando que ele tinha mudado de forma, que eu era uma boa alminha fazendo algo para diminui-lo e diminuir seus reflexos, agora ele é o velho massacre do século XVI, onde a autoridade branca avança e destrói em nome de sua sede de sangue sem propósitos.
Por isso eu sinto vergonha de ser um homem do meu tempo. Porque há (pelo menos) um genocídio na minha gestão. Um que é minha responsabilidade. Eu queria poder fazer como alguns colegas de redes sociais e acrescentar ao meu sobrenome a palavra “Guarani”. Mas no meu caso não iria funcionar, seria idiota. Tão idiota como se eu ignorasse toda a história contra qual lutamos hoje para me dizer “negro”. Não passaria de um disfarce hipócrita para aliviar minha consciência do peso dos crimes de nossos pais fundadores.
Eu não sou um índio Guarani. Sou um homem branco que assiste um genocídio de dentro de um sarau, possivelmente com uma lata de cerveja nas mãos. Tenho vergonha de estar aqui hoje.”

::eu fui, você não::

E nem tinha que ir mesmo, era um evento particular e não divulgado. Nós já vínhamos conversando informalmente sobre sermos um movimento literário (mais literário do que movimento). Tentamos, informalmente, fazer uma reunião no Malleta, mas tudo ainda estava muito insipiente. Daí resolvemos parar com a pouca vergonha e oficializar a coisa com calendário de reuniões, projetos e a criação de um departamento de marketing e relações públicas.
Nós quem? O Nerito, do Blog “O Guardião”, a Simone, do “Cálida Poesia” e eu. Achamos importante que o local da primeira reunião fosse simbólico e tivesse a ver com movimentos culturais literários, portanto escolhemos o pedante, ostentativo e afrescalhado café do Palácio das Artes (com aqueles petiscos caros e ilusórios) como ponto de partida pro coletivo de literatura.
A Simone, que tinha mais o que fazer da vida, não foi e a reunião ficou sendo do Nerito comigo. Como todo coletivo, por mais canastrão e vagabundo, possui um nome, começamos a reunião com um debate sobre qual seria o nome do coletivo. Foram ventiladas duas sugestões, ambas com bons argumentos favoráveis e desfavoráveis e explicações metafísicas desnecessárias que eu descrevo a seguir:
Sugestão 01 – “clube da Serpente”: Esse nome é tirado do livro “O Jogo da amarelinha” (que os cults devem conhecer por Rayuela), do Cortázar. O argumento contra é que esse nome é tirado do livro “O Jogo da Amarelinha (que os cults devem conhecer por Rayuela), do Cortázar. Nós não temos nenhuma influência direta dele na nossa escrita e pode ser que alguém se iluda achando que somos viúvas dele, tentando recriar sua escrita e seu universo literário (se amanhã eu acordar e descobrir que estou escrevendo igual ao Cortázar, largo essa porcaria de blog e vou embora ficar rico). O argumento a favor é que o Clube da Serpente, no livro, é uma reunião de pândegos, literatos e intelectuais que se juntam pra tomar cachaça e resolver os problemas da humanidade, o que é bem próximo do que a gente tem tentado fazer. Além disso, Clube da serpente tem sexy appeal, funciona bem como nome de coletivo;
Sugestão 02 – “filhote de lobo”: o nome foi tirado do poema “O que eu quero de você”, do Fabrício Corsaletti (um filhote de lobo/ pra morder minha mão direita/ quando eu estiver no escuro/ depois que o amor acabar) e usado por mim como imagem literária num texto que eu plagiei da Simone (eu sou assim, nada que eu faço é original). O argumento à favor está na imagem do lobo e da metáfora “lobo”, como símbolo de força, selvageria, liberdade, inocência e lealdade. Quem duvidar disso pode ouvir “Of wolf and man”, do Metallica. Eu acredito no Metallica. O argumento contrário é que o nome tem mais a ver com meus devaneios pessoais e não necessariamente reflete uma visão ou posicionamento do Coletivo, além de ser um nome comercialmente fraco.
Depois de não chegar a nenhuma conclusão resolvemos passar para o próximo ponto: vamos admitir mais gente no Coletivo? A conclusão dessa pergunta foi a coisa mais legal da reunião. Resolveu-se (o Nerito resolveu, eu bati palmas) criar uma distinção entre um coletivo e um “movimento literário”. No primeiro, nós três vamos pensar em publicações e no segundo vamos organizar clubes de leitura, saraus cheio de cachaça e encontros para avaliação e troca de textos que os membros forem produzindo (a gente também pode montar especial pra Porto Seguro). Um barato isso, principalmente porque se aparece alguém no movimento que seja melhor que a gente, tacamos no coletivo e a pessoa ainda vai sentir que nós estamos fazendo um favor pra ela! Maquiavélico e perfeito. Resolvido isso, passamos ao mais importante: escrever o que, publicar o que? Por mais que a conclusão seja simples, a gente gastou um tempo refletindo nisso. Não faço ideia dos custos, sei que não é nada exorbitante, mas não é uma grana que eu tenha no meu pote de moedas. E não sei da Simone, mas Nerito e eu queremos ilustrações, então tudo tem que ser cautelosamente avaliado. Mas partindo do princípio “fodido = fodido e meio”, achamos que o melhor é lançar um livro cada um & lançar um livro com trabalhos dos três. Eu tenho complexo de vira-lata e fico me depreciando o tempo todo, mas dessa vez acho que vai ficar foda! Pelo menos minha mãe vai ter que comprar.
Essa foi a parte um da reunião. A segunda parte da reunião foi complicada demais pra quem não tem conhecimento especializado, então não vou ficar me estendendo. Fomos ao Habib’s fazer um lanche de verdade e discutir profundamente as bases filosóficas da J. K. Rowling, além de iniciar um pequeno ensaio de literatura comparada sobre “as mil e uma noites” (livro), “a espada era a lei”(desenho Disney) e “Cabaré Mineiro” (pornochanchada nacional).
A próxima reunião está agendada, dessa vez vamos levar stakeholders, uma equipe de consultoria japonesa e a Simone, pra facilitar a tomada estratégica de decisões. E apesar do coletivo não ter uma liderança, se você está lendo esse texto é porque além de ser uma pessoa paciente, o Nerito me autorizou a publicar…

::Sobre Dinossauros, Galinhas e Dragões::

Bom, eu tinha que começar isso com outros dois eventos, mas a proscrastinação foi muita, então melhor começar por este e ir publicar os outros posteriormente. O pior é que se tratando de algo que recebeu mídia (matéria de jornal eu tenho certeza) pode ser que você TENHA ido ao espetáculo… se bem que estamos em BH, onde ninguém vai ao teatro, então continua sendo um evento que você (provavelmente) não foi.
Meus conhecimentos sobre arte contemporânea é idêntico aos do teatro contemporâneo, ou seja, não sei nada sobre eles. A única diferença que vejo nos dois é que depois de explicada, a arte contemporânea fica legal e o teatro tende a piorar…
Vamos ressaltar os pontos positivos: as atrizes são ótimas. Eu não conheço nenhuma delas, então não estou fazendo média. O texto, o corpo, o posicionamento, tudo foi lindamente executado, com aquele mínimo imperceptível de erros (eu mesmo, não percebi nenhum). Exatamente como num show sertanejo.
E exatamente como num show de sertanejo eu achei que foi tudo uma bosta, muito bem executada, claro. A idéia da peça é ser um fanzine (pra dar nome aos bois, o fanzine Idéias Bizarras) encenado. Um Frankstein de textos pseudo-jornalísticos, com piadinhas ácidas e temas irrelevantes “cool”, tipo a Caverna do Dragão e as posturas de palco dos ícones da música pop. Se idéia delas é uma crítica a esse modelo de sociedade que não consegue se aprofundar intelectualmente em nada, que idolatra idiotas que fundamentam a carreira e copiar a moda da década anterior e que é fragmentada ao extremo, bem, elas falharam miseravelmente, porque a peça é uma ode a isso tudo. Se o objetivo da peça era ser uma ode, aí eu refaço meu comentário sobre ter achado tudo uma bosta: acho que tudo foi feito pensando-se em fazer uma bosta de peça.
Mas preciso voltar à analogia com o show de música sertaneja: só o Rodrigo achou ruim. O público foi ao delírio. Deve ser porque eu não entendo nada sobre teatro contemporâneo, ou porque eu conhecia tão bem as referências que consegui recitar quase todos os motivos do frango ter cruzado a estrada junto com elas (será que só eu recebi aquilo por e-mail oitenta mil vezes?). Ou porque meu senso de humor esteja quebrado e eu ria do que ninguém ri e fique me sentindo perplexo, silencioso e sozinho quando todos a minha volta se contorcem às gargalhadas.
Então, se você é um indie-cult-pós-moderno sem posicionamento político definido, que tem vergonha de contar pros amigos que adora stand up comedy (ou isso já é cult e não precisa ter vergonha, assim como ser homofóbico e contra as cotas raciais?), aproveite pra assistir essa peça que nada mais é que um “stand up” com cenário e coreografias.
Todo mundo adorou! E eu fiquei pensando “ainda bem que o mundo acaba ano que vem”.

::O evento que você não foi – explicando a nova categoria::

Resolvi exercitar minha capacidade de resenhista, que nunca foi das melhores. Minhas vítimas serão eventos com pouca ou nenhuma divulgação, normalmente promovidos pelos Centros Culturais de Belo Horizonte.
A senvergonhisse (nesse caso, da prefeitura) é tamanha que eu poderia apostar que um possível leitor desse texto só saberia que BH tem uma rede de quase vinte centros culturais se ele for o funcionário da Fundação de Cultura.
Se não existe nenhum interesse político em divulgar a existência de Centros Culturais, a idéia de divulgar os eventos dos centros chega a soar jocosa. Aposto que existe um setor no departamento de comunicação da prefeitura destinado a rir e fazer piadinhas de humor negro com as solicitações de peças gráficas oriundas da FMC…
Mas mesmo sem a mão benta de nosso prefeito (ou talvez por isso mesmo), há coisa interessante rolando de segunda a sexta, no horário comercial e em algumas noites e finais de semana do mês e eu vou fazer o hercúleo esforço de falar sobre as que eu participar. Claro que, como tudo no blog, isso será feito de maneira aleatória descompromissada e tosca.
E como tenho que certeza que pelo menos um dos meus dois leitores que trabalham na FMC irão perguntar “porque resenhar eventos aos quais você foi e não divulgá-los antes de acontecerem?”, respondo que: bem, com uma média de três visitas diárias e possuindo exatos quatro leitores (donde dois são funcionários), acho que não vale à pena. O Bom Dia, Mundo cruel! é um bloco de notas virtual e não um veículo de comunicação.